24 de fevereiro de 2010


TULIPAS


Traga um buquê
De tulipas negras
Do teu amor, as cinzas

(Entrega-me numa caixa de vidro)


Necessária transparência
Para que eu veja
Que de ti
Só resta
O que ardeu um dia

Sandra Fuentes





FOLHA




Que a leveza que sinto hoje
Faça de mim uma folha
Levada pela brisa
Que eu percorra a vida
Sem o peso
Da obstinação
De ser feliz

E que eu caia
Delicadamente
Num lugar
De onde eu possa contemplar
Que a árvore de onde saí
Trazia consigo
Toda a felicidade...




Sandra Fuentes

SILÊNCIO


E ela o aguardava todas as manhãs.
Ele não fazia barulho.
Invadia seu quarto e a amava.
Ela sentia-se uma deusa.
Seu quarto era o paraíso, o santuário escolhido e separado.
Ele não fazia barulho para sair.
Voltaria mais tarde, se quisesse.
Deixava com ela apenas o gosto amargo da solidão e do silêncio.

Sandra Fuentes


NAVE DE CONCRETO



Ela queria apenas ver como era o rosto dele iluminado pela lua nova.E viu. Era como imaginava. Sentou-se nas pedras e ficou esperando anoitecer. Quem era ele? Ela sabia. O mar a fascinava. Mistério e escuridão. Beijos roubados e ondas batendo nas rochas. À noite não se enxerga muito bem o futuro. Eles tinham o que havia de mais precioso. Este tesouro guardavam em segredo. Ela o olhou mais uma vez. Dançaram ao som de uma canção que só eles ouviam. E saíram dali. Os dois apenas. Numa nave imensa e branca, feita de concreto.


Sandra Fuentes

Niterói, 19 de fevereiro de 2010.




CEM POEMAS INÉDITOS


Deixo em tuas mãos um livro com cem poemas inéditos. Não os leia antes do amanhecer. Quero ver contigo o nascer do sol. Espero ansiosa que anoiteça para velar teu sono e cuidarei de ti como quem vigia uma joia rara. Meu coração é uma redoma feita de um vidro único. Aposte o que quiser. Faça um pacto de amor comigo. Acelere teu pensamento. Viaje em meus mistérios e tenta desvendar-me. Saberás de tudo quando abrires o livro. Decifrarás meus versos. Lerei contigo. Cada um dos cem poemas, assim que o sol aparecer.


Sandra Fuentes

OUTONO


As lágrimas fazem o caminho de volta
E a poesia bate novamente à porta
Melódica e suave
Ouço violinos tocando a nossa música
E finalmente respiro o ar do outono
Acho que já passei por esta rua
Já vi estas árvores...
Aquelas flores estão no mesmo lugar
Sempre gostei das tulipas
Tenho ainda uma guardada comigo
Milênios e seu perfume permaneceria
Memórias - só tuas fotos que guardo comigo
Começa a chover e o som da água batendo nas árvores abafam o som dos teus passos
Mas posso ouvi-los
Esperei muito por eles
Uma vida inteira
Finalmente caminhas em direção a mim

Sempre vale a pena esperar pelo outono...

7 de fevereiro de 2010


POR ONDE ANDARÁ SANDRA FUENTES?


Não a vejo há anos. Acho que a última vez que a vi foi em junho de 1999. Sempre a achei meio introspectiva, um pouco tímida talvez. Sofria de solidão. Sentia falta de si mesma. Perdeu-se. Gostava de escrever e fazia da poesia seu divã. Mas... por onde anda? Sei que casou, teve filho. Ouvi dizer que tem um espelho no quarto. Um enorme espelho. Mas que não é o suficiente para que possa ver sua imagem refletida. Dizem que está quase cega. Quase muda. Quase morta.Pena...Gostava da vida. Sonhava um dia em viver um grande amor. Lembro que Sandra adorava a cor azul, mas só vestia roupa preta. Nunca entendi isso.Com quantos anos estará agora? Não era feia nem bonita, como que costumava dizer. Li algumas de suas poesias. Parece triste. Não era... Um pouco fechada, talvez. Misteriosa.Queria encontrá-la por aí qualquer dia. Sinto falta das suas piadas e do seu jeito de falar como se estivesse num palco. Eu achava graça. Lembro-me dela dançando, do seu sorriso, daqueles olhos negros que pareciam buscar algo que nem ela sabia exatamente o quê.Acho que só queria ser feliz.Que coisa...Por onde andará Sandra Fuentes?